Acompanhamento e dedicação auxiliam no desenvolvimento de crianças autistas

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Thibério Rodrigues

centrodeinclusao_autismo_foto_dayseeuzebio 420Isaac tem 5 anos e, como qualquer criança dessa idade, gosta de brincar e receber o carinho de sua mãe e familiares. Mas a rotina do menino é um pouco diferente das outras crianças, pois ele é autista e necessita de cuidados especiais para o seu desenvolvimento e convivência no ambiente social.

A mãe do menino, Regina Leite, conta que ele teve dificuldades no desenvolvimento desde muito cedo e demonstrava ter um comportamento agitado. “Ele deu os primeiros passos um pouco tarde e tinha algumas atitudes agressivas, mas eu não entendia o motivo”, disse Regina.

Ela recorda que, por conta das dificuldades que o filho apresentava, resolveu levá-lo a um neurologista quando tinha apenas 6 meses, mas não teve respostas concretas e, apenas quando Isaac já estava com 2 anos de idade, tiveram o diagnóstico que o menino tem o Transtorno do Espectro Autista (TEA), uma condição do desenvolvimento neurológico, caracterizado por uma alteração da comunicação social e pela presença de comportamentos repetitivos.

Desde então, Regina tem buscado a melhor forma de acompanhamento para o seu filho e encontrou o Centro de Referência Municipal de Inclusão da Pessoa com Deficiência (CRMIPD) da Prefeitura de João Pessoa (PMJP), onde o menino é atendido atualmente.

Assim como Isaac, outras crianças autistas também recebem acompanhamento no Centro. É o caso de Matheus Bezerra, que tem 9 anos de idade e foi diagnosticado com TEA aos 3 anos. “Quando ele nasceu o desenvolvimento dele era normal, mas houve um bloqueio na fala. Então na primeira escola em que ele estudou, a diretora percebeu que ele poderia ser autista e me orientou a procurar um médico”, contou Márcia Bezerra, mãe de Matheus.

De acordo com a terapeuta ocupacional do CRMIPD, Maria Eduarda Fonseca, a maioria das crianças com autismo começa a demonstrar sinais antes de completar 18 meses de vida. “As crianças autistas normalmente têm dificuldades na interação social e na comunicação verbal e não verbal”, afirmou.centrodeinclusao_autismo_foto_dayseeuzebio 427

Ainda segundo a terapeuta, outras características podem ser percebidas no comportamento da criança autista, pois ela costuma ser retraída, tem acessos de raiva intensos, fica presa em uma única tarefa, apresenta poucos interesses, sofre fortes alterações emocionais quando há alguma mudança em sua rotina, tem movimentos corporais repetitivos, entre outras.

Acompanhamento e dedicação – No Centro de Referência Municipal de Inclusão da Pessoa com Deficiência, crianças como Isaac e Matheus recebem tratamento e acompanhamento por meio de uma equipe multiprofissional formada por fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, assistente social, neurologista, pediatra e psicopedagogo. No local é oferecido atendimento educacional especializado com atividades como musicoterapia, arte terapia e educação física adaptada.

A musicoterapia é um dos momentos preferidos de Mariana Ferreira. A menina, que também é autista, tem 9 anos de idade e já é atendida no Centro há dois anos, onde tem a oportunidade de desenvolver seus potenciais ao lado de outras crianças que enfrentam dificuldades parecidas com as suas.

“Ela demonstrava um comportamento arredio. Quando ela tinha 1 ano e meio, a médica da Unidade de Saúde da Família me encaminhou para que eu a levasse a um neurologista. Depois disso, recebemos o laudo e foi muito difícil de início porque eu já tinha um filho especial”, contou Francineide Oliveira, mãe da menina.

centrodeinclusao_autismo_foto_dayseeuzebio 401Os pais das crianças destacam que o acompanhamento profissional tem resultado positivamente na rotina de seus filhos. Para Regina Leite, mãe de Isaac, a orientação da equipe é muito importante para os pais e também paras as crianças, que sentem o apoio e o acolhimento dos profissionais durante cada uma das atividades.

“Isso estimula até a interação com as pessoas ao redor. Aqui meu filho recebe um atendimento humanizado. Alguns pais de filhos autistas não sabem o que fazer sobre a situação do filho e, como mãe de uma criança autista, eu indico que eles também procurem ajuda profissional e reconheçam que seus filhos necessitam desse apoio”, disse Regina.

Para a coordenadora da área de Saúde do CRMIPD, Nádja Serrano, uma das principais funções do trabalho desenvolvido pelos profissionais é proporcionar a inclusão das pessoas que são tratadas no local. “Nós tentamos passar para eles a certeza de que são capazes de se desenvolverem e superarem os desafios de suas deficiências. Buscamos devolver o exercício da cidadania através, também, do aconchego e do acolhimento”, afirmou.

De acordo com a terapeuta ocupacional do CRMIPD, Maria Eduarda Fonseca, há vários métodos de tratamento para autistas, mas cada pessoa possui suas singularidades. “Portanto não existe uma melhor abordagem de tratamento, na realidade existe aquela que mais se aproxima das necessidades da criança”, afirmou. O diagnóstico do autismo é clínico, feito através de observação direta do comportamento e de uma entrevista com os pais ou responsáveis.

Abordagem especializada – Com a finalidade de auxiliar no tratamento das crianças autistas, o Centro dispõe de uma sala multifuncional com função cognitiva, social e comportamental, que pode ser utilizada por profissionais de diversas áreas. O local possui materiais reciclados utilizados de acordo com a estrutura de ensino TEACCH, uma abordagem especializada para pessoas com autismo.centrodeinclusao_autismo_foto_dayseeuzebio 023

Os mecanismos essenciais da estrutura de ensino consistem na organização do ambiente e atividades de forma que possam ser compreendidas pelas crianças no uso de seus pontos fortes em habilidades visuais e interesse em detalhes visuais para suprir habilidades relativamente mais fracas; no uso dos interesses especiais das crianças para engajá-las no aprendizado; e apoio ao uso de iniciativa própria em comunicação significativa.

 De acordo com Gabriela Ribeiro, fonoaudióloga do Centro, os instrumentos utilizados na sala auxiliam na auto-regulação das crianças. “Cada material da sala tem um sentido de estar ali, pois ajudam a criança a buscar o controle dos seus atos quando ela não tem condições de ir diretamente para o atendimento em uma mesa. Então eles vão se ajustando aos poucos”, explicou a fonoaudióloga.

Apoio familiar – O trabalho profissional é fundamental para o tratamento das pessoas autistas, mas o apoio da família é um elemento muito importante para que esse tratamento dê certo, sobretudo para enfrentar as dificuldades que serão encontradas no cotidiano dos autistas.

“É essencial que os pais estejam engajados no tratamento, pois além de serem considerados a principal referência para a criança, estes também são os que estão no cotidiano com a mesma. Ao colocarem em prática no cotidiano o que foi orientado nas sessões de terapia, a criança obterá um maior nível de independência e qualidade de vida”, afirmou a terapeuta ocupacional Maria Eduarda Fonseca.

A dona de casa Regina Leite, mãe de Isaac, percebe que muitas pessoas ainda desconhecem o autismo e isso acaba gerando preconceito. “Algumas acham que quando meu filho fica mais nervoso, é ‘manha’ e uma senhora já chegou a me dizer que ele estava precisando apanhar. Eu respondi que ela não sabia o que ele tem e que não é de uma surra que ele precisa, mas sim de carinho e compreensão”, contou.

Francineide Oliveira é mãe de Mariana e ressalta que o apoio da família é fundamental para que a criança se sinta incluída na sociedade. “Meus familiares e amigos tratam minha filha normalmente, até porque ela é uma menina como qualquer outra que precisa de atenção e isso ajuda muito”, disse.

A partir do convívio com as crianças autistas, a fonoaudióloga Grabriela Ribeiro destaca que a maior dificuldade para desenvolver o tratamento é o fato de que a maioria passou muito tempo sem um atendimento adequado. “Aqui nós conseguimos proporcionar um atendimento digno, mas é muito importante o comprometimento dos pais e a assiduidade da criança, pois é a partir da socialização que podemos chegar até elas para dar continuidade ao trabalho”, disse.

centrodeinclusao_autismo_foto_dayseeuzebio 178Direitos garantidos – As pessoas autistas têm o atendimento garantido tanto por leis federais quanto pela legislação estadual. Na Paraíba, a lei nº 8.756 de 2 de abril de 2009 institui o Sistema Estadual Integrado de Atendimento à Pessoa Autista, bem como as diretrizes para a plena efetivação dos direitos que propiciem o bem estar dos autistas.

Já a lei nº 9.563 de 6 de dezembro de 2011 institui o Dia de Conscientização sobre o Autismo no Estado da Paraíba, celebrado no dia 2 de setembro, com o objetivo de ampliar o conhecimento dos direitos e garantias de cidadania da parcela da população com autismo, assim como a divulgação e disseminação de iniciativas governamentais inclusivas em âmbito estadual.

Em nível nacional, a proteção dos direitos da pessoa com Transtorno do Espectro Autista está garantida por meio da lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Mas foi com o decreto 8.368 de 2 de dezembro de 2014, do Governo Federal, que os autistas passaram a ser considerados pessoas com deficiência e devem ter atendimento integral garantido no Sistema Único de Saúde (SUS). Além da medicação gratuita, deve ser garantido o encaminhamento para os centros especializados em reabilitação e centros de atendimento psicossocial.

Centro de Inclusão – O atendimento realizado no Centro de Inclusão é feito após uma triagem de avaliação. Os usuários recebem atendimento individualizado ou em grupo, em um ou mais tipos de terapia ou de capacitação para o trabalho, sob a responsabilidade de cada setor específico, em um ou dois dias na semana.

Durante a estadia no local, todos os pacientes são encorajados a serem independentes. Dentro de cada limitação, os profissionais buscam apontar caminhos para que os pacientes não façam de suas limitações, física ou intelectual, um empecilho para desenvolver uma série de atividades. Além do atendimento às pessoas com deficiência, o Centro oferece também um trabalho direcionado para os familiares, realizado por um psicólogo.

O projeto atende a um total de 250 usuários, desses aproximadamente 70 são autistas, entre adultos, crianças e adolescentes. O trabalho é uma parceria das secretarias de Saúde (SMS), Desenvolvimento Social (Sedes) e Educação e Cultura (Sedec) da Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP). Está localizado na Rua Coronel Otto Feio da Silveira, 161, Conjunto Pedro Gondim, e funciona de segunda à sexta-feira das 8h ás 12h e das 13h às 17h.