PMJP atende cerca de 400 pessoas mensalmente por meio do projeto ‘Consultório na Rua’
Lílian Pedreira
“Faz tanto tempo que vivo na rua que não sei dizer exatamente quando vim pra cá. Já tive empregos fixos, mas devido às más influências comecei a beber muito e quando dei por mim já estava vivendo nas ruas em situação bem precária”. Esse é o relato de um mineiro de 53 anos, natural de Novo Cruzeiro, que migrou para João Pessoa e atualmente vive pelas ruas da Capital paraibana. Ele é um dos cerca de 400 homens e mulheres em situação de rua que são acompanhados pela equipe do projeto Consultório na Rua, da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).
Com o acompanhamento do projeto, ele foi encaminhado para uma casa de acolhida da rede municipal. “Estou cansado e sinto que preciso me cuidar. Vejo boa vontade nos profissionais de saúde em cuidar da gente que vive na rua”, afirmou.
O ‘Consultório na Rua’ foi instituído em 2009 pela Política Nacional de Atenção Básica do Ministério da Saúde e chegou a João Pessoa em 2010. “Nossa prioridade é garantir a assistência, o cuidado e acompanhar os usuários de perto. A arte é uma das diversas estratégias que utilizamos para chegarmos a eles e assim conseguimos identificar as necessidades de cada um”, explicou Andressa Cavalcanti, técnica da atenção básica e coordenadora do Consultório na Rua.
As visitas são realizadas a partir de um mapeamento das áreas da Capital, que permite saber em que localidade as pessoas em situação de vulnerabilidade social, em especial pelo uso de álcool e outras drogas, costumam habitar.
O projeto conta com 24 profissionais, incluindo enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e agentes sociais, que são divididos em quatro equipes, sendo duas no turno da manhã e duas à tarde. O trabalho funciona de forma continuada, em que as equipes da tarde voltam aos mesmos locais visitados pelos profissionais da manhã.
Nina, de 44 anos, como é chamada carinhosamente pelos colegas, também recebe orientações e cuidado dos profissionais do projeto. “Moro na rua há aproximadamente 30 anos e às vezes penso em sair dessa vida, do vício do álcool, mas é muito difícil. A gente se acostuma com tudo, até com o que é ruim para nossa mente e para o nosso corpo”, disse a mulher que tem psoríase e recebe os tratamentos dos técnicos do projeto.
Quando há necessidade, a assistência é promovida pela rede de serviços da Secretaria Municipal de Saúde, por meio das Unidades de Saúde da Família (USFs), Unidades Básicas de Saúde (UBS), Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e hospitais. Como parte do programa, os técnicos ainda auxiliam com os direcionamentos para retirada de documentos, como Registro de Nascimento, Registro Geral e Cartão do SUS.
“No projeto também temos a parte social, com um cuidado ampliado. O Assistente Social trabalha com Benefício de Prestação Continuada (BPC), que orienta os usuários para os encaminhamentos quando necessário, como o bolsa família, auxílio moradia, entre outros benefícios que são ofertados”, enfatizou Andressa Cavalcanti.
Conquistando a confiança – Os contatos são discretos e receptivos, conduzidos por atitudes acolhedoras. Cada profissional desenvolve suas atividades planejadas e de acordo com as demandas que se apresentarem no momento. Após a identificação e dos primeiros diálogos, os usuários que precisem de atendimentos médicos, e que queiram ir, são levados pela própria equipe para um dos serviços de saúde.
Em média, a equipe do Consultório de Rua atende cerca de 400 pessoas por mês. Mas atualmente, 300 moradores em situação de rua são cadastrados em João Pessoa. Como se trata de uma população flutuante, a maioria vem de outros municípios ou estados.
“Muitas vezes, quando esses usuários identificam a equipe do Consultório na Rua, se aproximam para pedir ajuda e relatar seus problemas de saúde. Eles sempre dizem que querem sair das ruas, mas quando conseguimos uma unidade de acolhimento provisório, eles ficam receosos de sair das ruas e recusam a acolhida”, relatou a assistente social do programa, Rúbia de Souza.
Dentro do perfil dos usuários atendidos pelo programa, a maioria são homens em idade adulta e com doenças sexualmente transmissíveis. Há também as crises de abstinência de drogas, principalmente relacionados à utilização do crack.
“Esse programa vem para fazer a reinserção social, garantir o acesso e direito dessa população que tem o direito avalizado na constituição, porém, muitas vezes, são negligenciados”, ressalta a coordenadora do Consultório na Rua.
Casas de acolhimento – O trabalho da Secretaria Municipal de Saúde, desenvolvido em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), conta com cinco casas de acolhimento onde são abrigados, de formas distintas, pessoas de 0 a 17 anos e 11 meses. Já a população adulta, com idades entre 29 a 59 anos, conta com uma casa de apoio.
“Em se tratando do público infanto-juvenil, quem expressa o desejo de sair das ruas e ir para uma casa de acolhimento, passa antes por atendimento do Conselho Tutelar, que encaminha essa criança ou esse jovem para as unidades”, explicou Expedito Carvalho, coordenador da Proteção Social Especial de Alta Complexidade da Sedes.
O público adulto é encaminhado para o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), que tem a finalidade de assegurar atendimento e atividades direcionadas para o desenvolvimento de sociabilidades, na perspectiva de fortalecimento de vínculos interpessoais e familiares que oportunizem a construção de novos projetos de vida e alternativas a saída das ruas.
“Quando não conseguimos ter êxito na inserção ao ambiente familiar, encaminhamos para um serviço de acolhimento e lá eles têm toda assistência em saúde, educação, cursos de profissionalização, alimentação e demais garantias que proporcionam dignidade de vida”, destacou Expedito Carvalho.